Brasil fora da elite, possível boicote e dúvidas: conheça a escalada olímpica
O hábito de frequentar montanhas é inerente ao ser humano e o acompanha desde a pré-história. Escalar sempre foi preciso, seja por estratégia, geografia, religião ou sobrevivência. Esporte desde 1786, a escalada agora é modalidade olímpica e está inserida no programa de Tóquio 2020. Estreando nos Jogos, ela é dominada pelos europeus e ainda engatinha profissionalmente no Brasil sob a responsabilidade da Associação Brasileira de Escalada Esportiva (ABEE). Com cerca de 90 filiados e um orçamento de R$ 20mil/ano em 2016, a entidade, criada em 2014, espera que o Brasil, apesar de estar longe das potências mundiais, consiga classificar atletas para a próxima Olimpíada.
- Nascemos de forma independente para que os atletas do Brasil pudessem seguir participando dos campeonatos internacionais. Com a inclusão olímpica, estamos reformulando toda a estrutura da associação, profissionalizando o esporte e formalizando nossa parceria com o Comitê Olímpico do Brasil (COB), com quem já temos uma reunião agendada. Queremos trazer técnicos experientes e trabalhar da melhor forma possível para administrar o esporte no país - explica Janine Cardoso, atleta e presidente da ABEE.
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No âmbito internacional, a International Federation of Sport Climbing (IFSC) é a responsável pela disseminação do esporte e organização dos campeonatos mundiais. A modalidade é dividida em três vertentes, cada uma com seus campeonatos e campeões: velocidade, dificuldade (lead) e boulder. Crescendo no cenário e junto ao Comitê Olímpico Internacional (COI), a escalada é um esporte de investimento alto para seus praticantes. Iniciantes em boulder precisam investir cerca de R$ 1.400 para começar, enquanto a escalada em vias esportivas (ao ar livre) precisam de equipamentos que podem custar até R$ 3.500.
Em 2015, o esporte tinha cerca de 25 milhões de praticantes no mundo, com 82 países filiados à IFSC, 140 países representados por atletas mesmo que independentes e um crescimento de 50% no número de locais de prática da modalidade desde 2007. A média de idade dos atletas de elite é de 19 anos, ou seja, na escalada o competidor atinge o ápice muito cedo e atletas que hoje estão com 14 anos podem chegar em Tóquio como favoritos.
FORMATO OLÍMPICO EM ESTUDO
O Comitê Olímpico Internacional e a IFSC ainda estudam a forma de disputa da escalada em Tóquio 2020. Em março há uma reunião marcada para sacramentar a dinâmica. Uma certeza, contudo, já existe. A modalidade irá distribuir seis medalhas no Japão e será disputada por 20 homens e 20 mulheres, um total de 40 competidores. Serão dois pódios completos, um no masculino e outro no feminino. Por isso, o melhor formato para o esporte ainda é buscado. Para facilitar isso e entender a dinâmica da escalada, ela estará nos Jogos Olímpicos da Juventude em 2018, em Buenos Aires, na Argentina.
Ainda não é oficial, mas a IFSC apresentou ao COI um formato de disputa que contemple suas três vertentes: velocidade, dificuldade (lead) e boulder. A ideia é que todos os atletas disputem as três provas e que a soma dos pontos de todas defina os medalhistas. A ideia é defendida pela maioria dos atletas, alguns, porém, discordam. Temem que o campeão olímpico não seja o melhor em nenhuma das três práticas. Um deles é Adam Ondra, o checo de 23 anos e tratado como uma lenda da escalada.
- Não posso concordar completamente porque acredito que a escalada de velocidade é uma espécie de esporte artificial pois eles escalam em uma via igual sempre e isso não tem a ver com a filosofia da escalada. Se for assim, juntando todas as vertentes e com a soma de pontos entre elas, eu terei que pensar profundamente se irei participar ou boicotar as Olimpíadas - disse Ondra em entrevista recente à "Epic TV".
ENTENDA AS VERTENTES
Escalada de velocidade - É o mais simples. Tem-se um muro com duas vias (percursos) exatamente iguais e ganha quem chegar mais rápido no topo. Esse percurso é homologado e em todos os campeonatos oficiais é o mesmo.
Escalada em dificuldade (lead) - No Lead ou, em português, dificuldade, tem-se um via de alta dificuldade (em cada campeonato, e em cada fase do campeonato, é uma via diferente), em um muro de escalada alto, e ganha quem chegar mais longe. O tempo, neste caso, só conta como último critério de desempate.
Escalada em boulder (bloco) - Tem-se um determinado tempo para completar um percurso curto (boulder), mas com com dificuldade super concentrada. Na fase final, por exemplo, são cinco minutos para completar cada um dos quatro percursos da fase. Assim, quem completar mais boulders, é o vencedor. Tem também a figura da agarra bônus, cada percurso tem uma que conta na pontuação também.
BRASIL FORA DA ELITE MUNDIAL
Hoje, o Brasil está fora da elite mundial do esporte. Nenhum atleta do país aparece entre os melhores ou 40 primeiros do ranking mundial. Porém, o critério de classificação olímpica ainda não foi definido. Caso a corrida olímpica leve em conta apenas o ranking mundial, o Brasil dificilmente terá um representante em Tóquio. Se a vaga vier por competições continentais, porém, a situação muda de figura, já que o país é exemplo de administração e se destaca no contexto sul-americano. Os principais atletas do Brasil no momento são Thais Makino, campeã brasileira de boulder e vice-campeã de dificuldade, Bianca Castro, Jean Ouriques e Felipe Ho.
- É muito possível que a qualificação para os Jogos Olímpicos ocorra considerando minimamente os Continentes, ou seja, haja qualificatórias na Europa, Ásia e América. Assim, acredito que o Brasil tenha chances de mandar representantes, porque mesmo não tendo expressão no circuito internacional (Copas do Mundo e Campeonato Mundial), tem bons resultados nos campeonatos realizados na América do Sul. Assim que saiu a aprovação da escalada esportiva para Tóquio 2020, fiquei bastante animada. Entretanto, como atualmente moro na Itália, minha participação dependerá de como será a seletiva para os representantes do Brasil. Mas, de qualquer forma, já estou treinando - garante Bianca Castro.
A escalada no Brasil era administrada pela Confederação Brasileira de Montanhismo e Escalada, a CBME. Em 2014, porém, a entidade, por motivos financeiros, abriu mão da filiação à IFSC. Assim, os atletas profissionais do Brasil estariam fora da disputa internacional. Para que isso não acontecesse, a IFSC orientou os brasileiros a criarem uma associação. Nasceu então a ABEE, que desde então é a única filiada e oficialmente responsável pelo esporte de alto rendimento no país.
Organizada de forma voluntária até então, a ABEE passa por um completo processo de reformulação com a novidade olímpica. O esporte será profissionalizado, profissionais serão contratados e um plano de negócios e esportivo será traçado. Uma reunião com o COB foi marcada para janeiro para definir os investimentos e o caminho a ser seguido, já que a partir do próximo ano a Associação terá direito a receber recursos da Lei Agnelo Piva, o que muda o patamar financeiro da escalada no país.
No cenário internacional, a escalada é dominada pelos europeus. No lead, o esloveno Domen Skofic lidera, seguido por Jakob Schubert, da Áustria, e Romain Desgranges, da França. No bouldering, o Japão é líder com Tomoa Narasaki e Kokoro Fujii. O russo Alexey Rubtsov é o terceiro colocado. Já na velocidade, o polonês Marcin Dzienski é o líder, seguido por Stanislav Kokorin, da Rússia, e Danyil Boldyrev, da Ucrânia. No feminino, a eslovena Janja Garnbret é a primeira do mundo no lead. Shauna Coxsey, do Reino Unido, é a número um no boulder. E Iullia Kaplina, da Rússia, é a líder na velocidade.
Autor: ,postado em 04/01/2017
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