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De perseguidor de cabras a "viajado": Petrúcio corre para ganhar o mundo


De perseguidor de cabras a

São José do Brejo do Cruz é uma cidadezinha com menos de dois mil habitantes. Foi na terra árida do interior da Paraíba que um menino ligeiro, de pernas finas, deu os primeiros passos do que seria uma corrida para levar o próprio nome e o de sua terra natal mundo afora. Na brincadeira dos amigos, era um "perseguidor de cabras". Na vida real, com o braço esquerdo amputado, Petrúcio Ferreira tornou-se campeão mundial dos 200m da classe T47 aos 19 anos, firmando-se como uma das principais referências do esporte paralímpico brasileiro na chamada “Geração Pós-Londres”. Em Toronto, o velocista estreia em Jogos Parapan-Americanos com a responsabilidade de manter a tradição verde-amarela de domínio nas pistas de atletismo.

Petrúcio Ferreira, paratletismo (Foto: Divulgação / Comitê Paralímpico Brasileiro)Petrúcio Ferreira passa de promessa a recordista mundial rapidamente (Foto: Divulgação / Comitê Paralímpico Brasileiro)

Petrúcio era acompanhado como uma grande promessa, mas antecipou as previsões sobre seu potencial ao superar os tempos do compatriota campeão paralímpico Yohanson do Nascimento. No Open Internacional de São Paulo, em abril deste ano, o rapaz deixou o ídolo para trás e cravou a melhor marca do mundo na prova: 21s49, 25 centésimos mais baixa que o recorde anterior, estabelecido nos Jogos de Pequim.

Coordenador técnico do atletismo do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), Ciro Winckler afirma que a evolução de Petrúcio até o momento corresponde às expectativas pelo que o atleta vinha apresentando desde que foi integrado à seleção de jovens, em 2014. Animado com os tempos conquistados pelo prodígio, ele prefere não estabelecer metas de cobrança em um primeiro momento.

- Não tem surpresa porque a gente tem acompanhado ele no dia a dia nesse último ano. A gente tem inserido ele nos nossos programas de alto performance na seleção, na consultoria do Michael Johnson... Ele estar fazendo bons resultados não nos surpreende. Já estamos prevendo a evolução dele. Tem muito a crescer ainda, é um atleta jovem que está modificando os parâmetros de treinamento, educando o corpo para ser atleta. Ele tem muito para evoluir ainda. Qual o limite? É muito cedo para a gente prever.

O Parapan será o evento multidesportivo de maior porte da breve carreira de Petrúcio até então. Se entre os brasileiros ele chama atenção, o contato com atletas estrangeiros ainda foi relativamente limitado até então – seu primeiro Mundial será em outubro deste ano. Sem se intimidar, o velocista quer apresentar seu cartão de visitas o quanto antes. 

- Ainda não estou bem conhecido lá fora, mas pretendo ficar em alguns dias. O Pan vai ser minha primeira grande competição. Sou novato ainda e não tenho competição importante ainda, outros atletas já participaram de Mundiais. Pelo menos já estou acostumado a correr ao lado do Yo (Yohansson), que tenho como tenho como espelho. Ele me dá alguns toques para eu chegar mais consciente na prova. 

A boa relação entre os dois atletas é um capítulo à parte. Campeão paralímpico em Londres nos 200m da classe T46, Yohansson é conhecido na delegação brasileira pelo altruísmo. Apesar de ainda ser jovem (tem 27 anos), divide a experiência de quem disputou duas edições das Paralimpíadas com quem estiver disposto a ouvir seus conselhos. Mesmo os adversários diretos, como Petrúcio, recebem as melhores dicas.  

Petrúcio Ferreira e Yohansson do Nascimento no Open de SP (Foto: Daniel Zappe/CPB/MPIX​)Petrúcio Ferreira e Yohansson do Nascimento no Open de SP (Foto: Daniel Zappe/CPB/MPIX​)

- Tem 10 anos que eu corro, e sei que nada nem ninguém é insubstituível. Desde a minha primeira Paralimpíada eu tinha consciência que uma hora ou outra apareceria alguém. Por isso eu fico tranquilo. Eu sabia que uma hora ou outra apareceria alguém e que eu não conseguiria ser campeão para sempre. A última vez que eu não trouxe medalha para o Brasil em uma competição foi em 2006, então eu tenho orgulho do que já fiz. Não estou jogando a toalha, porque ainda acredito no meu potencial, mas cada vez mais vejo que está chegando a hora de passar a bandeira como um dia o (Antônio) Delfino passou para mim – disse Yohansson.

ACIDENTE NA INFÂNCIA

A amputação de Petrúcio ocorreu quando ele tinha apenas dois anos de idade. O pai desligou uma máquina de triturar cana de açúcar e não reparou que o filho estava próximo demais. A engrenagem já estava parando, mas teve força o bastante para ferí-lo gravemente. Ele ao menos não se recorda da dor, só reproduz a história que lhe contaram. 

A falta do braço esquerdo não o impediu de ter uma infância feliz. Brincava com todas as crianças na rua, quase sempre correndo atrás da bola. Aos 16 anos, foi disputar um campeonato escolar em Catolé do Rocha, também na Paraíba. Lá recebeu um convite para disputar um torneio de atletismo em João Pessoa.  Ali começava uma carreira promissora.

Abertura dos Jogos Escolares da 1ª regional de ensino da Paraiba. Atleta Petrúcio Ferreira com a tocha Olímpica (Foto: Reprodução / TV Cabo Branco)Paetrúcio na abertura dos Jogos Escolares da 1ª regional de ensino da Paraiba. (Foto: Reprodução / TV Cabo Branco)

- Eu nunca tinha arremessado peso, não conhecia uma pista. Só via na televisão o (Usain) Bolt correndo. Nesse dia participei de três provas. Fiquei em segundo no salto, em primeiro no peso e nos 100m. Depois o Ciro me viu nas Paralimpíadas Escolares. Foi quando tive meu primeiro contato com um bloco, porque antes eu saía de pé. Para viajar me emprestaram sapatilha para eu correr, mas não quis botar porque não era acostumado. Achei que, se botasse, podia tropeçar e cair.

Ciro contesta esse detalhe. Diz que Petrúcio de fato não usava sapatilha, mas que correu de tênis, e não descalço, como reza a lenda. A prova, no entanto, foi o bastante para mostrar que o paraibano merecia atenção e investimento. Dali em diante, as convocações se sucederam. A primeira viagem internacional foi a um Sul-Americano de jovens no Chile. E, com a estrutura da seleção à disposição, os tempos foram baixando pouco a pouco. 

- A cada corrida o pessoal mexia que eu era rápido porque corrida atrás de cabra lá em casa. Mas para mim os 100m é como uma brincadeira. Estou na pista para brincar. Como toda criança na infância que brincou: “Quem chegar por último é a mulher do padre?”. Eu tento descontrair para não ter pressão e não ficar tenso na hora da prova, e está dando certo. Já competi no Chile, na França... Estou viajado. Eu sonhava viajar de avião, e olha o tanto que já viajei? Mas quero continuar, claro. Tem muito muito para correr.

Autor: ,postado em 07/08/2015


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